Luciano Aciolli Rodrigues dos Santos
Mirella
Rafaela dos santos Rocha
“Toda cidade tem seus tipos
[...]
Uma cidade sem êles
Vive cheia de ninguém...
[...]
Viva, Cobra fumano
Maria preta, Zé bolo Flô,
Em cada esquina uma saudade
Em cada canto uma canção de amor.”
Pascuma.
“Até meados dos anos de 1990, andou
pelas ruas de Cruzeta uma figura bastante cômica, chamada Dalila”.
Walclei de A.
Azevedo. Fatos Pitorescos de Cruzeta
No Ocidente contemporâneo a
procura por representações identitárias regionais incluindo as paisagens
rurais, naturais ou modificadas pelo trabalho humano e as “figuras etnotípicas”
locais está vinculada a uma política nacionalista de Estado que no Brasil remonta
ao início do século XX “conduzida por intelectuais que saem dos mais diversos
meios, reforçada pelos escritores regionalistas e pelos arautos do movimento
moderno nos anos 1920, sem mencionar gestos precedentes, do romantismo
oitocentista, dos circuitos imperiais às expedições etnográficas” do começo do
último século (Angotti-Salgueiro, 2005: p.26).
Para Angotti-Salgueiro o
interesse pelo local, o rural e o regional fazia parte de um movimento
internacional ocorrido em quase todos os países ocidentais, cada um em seu
tempo próprio que floresceu em períodos mais ou menos sincrônicos, no final do
século XIX e no período entre guerras que aliado às políticas culturais do
momento recrutava as ciências humanas em vias de estruturação especialmente a
geografia e a etnologia em prol dos movimentos regionalistas.
Se de um lado havia o Estado
que aspirava modernizar a sociedade valendo-se de uma série de medidas
sistemáticas e as cidades que se industrializavam, do outro existia um “Brasil
profundo” com seus “tipos” distribuídos no interior de seu habitat, expresso na
“rusticidade dos homens do mundo rural”, que já não se tem vergonha de revelar,
nem se teme parecer “atrasado” ou “longe da civilização” como no século XIX.
Pelo contrário
“as representações do país mudam em relação às do século
anterior – não é mais a hagiografia dos grandes homens, os fatos políticos, a
busca de traços urbanos de cosmopolitismo que contam. No naturalismo que define
os tipos nacionais, não se trata de geopolítica, mas de geografia humana, uma
geografia da vida no seu sentido mais próprio, com enfoques fitogeográfico,
biogeográfico, econômico, descrevendo-se as particularidades da relação
homem/ambiente/região Esse tipo de “celebração do mundo rural” não é apanágio
do Brasil tampouco (...) [Mas] fenômeno geral [deflagrado] na primeira metade
do século XX” (Angotti-Salgueiro,
2005: p.43-44).
Embora admitimos que nosso estudo não trata de analisar
propriamente o “tipo popular” ou “folclórico” tal como se revela na tradição
vidaliana ou na ideologia de Estado como aparece nos movimentos regionalistas,
não podemos negar que é a esta herança cultural que sua produção estará ligada
ainda na segunda metade do século XX, quando inusitadas figuras passam a
aparecer na literatura local associadas ao campo do folclore, do pitoresco e do
tradicional, sendo retratadas como elementos intrínsecos à uma “paisagem da
saudade” que já não enfeixa o mundo rural, mas a cidade em suas
“excentricidades”.
O antropólogo Roberto
Albergaria ao estudar o conjunto de “pessoas excêntricas” que “desfilavam suas
singularidades pelas ruas da capital baiana e se tornaram símbolos de uma
época” assim os conceitua como aqueles sujeitos “cuja singularidade está no limite entre a loucura e a excentricidade” explicando que o
cenário da “cidade pitoresca” anterior ao das “massas anônimas” que caracteriza
a urbe moderna e populosa da segunda metade do século XX, “representava um
grande teatro, onde as pessoas viviam suas diferenças publicamente”[2].
Vaqueiro nordestino. Tipo popular da região. |
Compondo deste modo o panorama da “geografia
humana” dos lugares, o “tipo popular” ou a “figura folclórica” foi tema
recorrente nos “livros didáticos” de geografia e história local e na produção
dos memorialistas do Seridó potiguar, dos quais tomaremos para análise as
“Noções de geografia e história do município de Cruzeta” de autoria da
professora Terezinha de Medeiros Góes e o livro de memórias “Meio século da
roça à cidade (Cinquentenário de Currais Novos)” de Antônio Othon Filho, ambos
publicados no início dos anos 1970.
Para endossar a análise deste estudo valer-nos-emos
do caso particular do sujeito Dalila Maria da Conceição (1913-1999), “mulata”,
dona de casa, “solteirona”, “tipo” de “beata do sertão” que fora transformada
em louca e esquizofrênica pela história e memória cruzetenses no momento em que
as identidades locais estão sendo geradas e pensadas entre as décadas de 1970 e
80.
Trajando seu velho hábito franciscano e conduzindo sempre
consigo seus santos protetores, Dalila "peregrinou" pelas ruas de
Cruzeta durante décadas até sua morte tranquila em 1999. Seguindo os velhos
passos dos antigos beatos dos sertões e guiando-se pelos horizontes da
tradição, seu comportamento "soava" como loucura. Para uma sociedade
que supervalorizava o homem moderno, "civilizado", polido, Dalila
fora interpretada como ser anormal, rude, irracional, excêntrico e por isso
mesmo, inventada como louca por não se enquadrar naqueles padrões sociais,
auferindo, desse modo, um lugar no “panteão dos tipos folclóricos” cruzetenses.
Hoje, buscamos "desenterrar" sua trajetória das brumas da memória e
"trazer à vida" seu passado negado pela história. Para tanto
utilizaremos da perspectiva da micro-história italiana e da biografia como
forma de “desconstrução” do “tipo” procurando estabelecer relações entre o
contexto histórico de sua produção, sua trajetória de vida e os elementos que
valeram na elaboração do tipo popular.
Tipos
populares: uma “tradição inventada”
Certamente em um tempo não
muito anterior ao nosso, sujeitos como Dalila eram muito mais frequentes serem
vistos perambulando pelas ruas das pacatas cidades seridoenses. Acredita-se que
de algum período para cá a sociedade mudou muito a sua forma de tratar e
conviver com seus "loucos". Se os nossos "tipos populares"
vivessem em nosso tempo, sem dúvida, muitos deles não conviveriam entre a
gente. A sociedade moderna aprendeu a entender que eles são um "perigo a
integridade física do cidadão" e a "ordem pública". Muitos
deles, seguramente, receberiam como destino a "tranquilidade" de um
manicômio ou o “isolamento de alcova”.
Este nos parece um motivo
que justifica a diminuta participação do “tipo popular” na “vida de rua” das
comunidades sertanejas, além daquelas decorrentes das profundas transformações
sofridas pelas coletividades globais nas últimas décadas que de um modo ou
outro tem tornando a “singularidade” cada vez mais inexequível nos pequenos e
grandes centros urbanos. Sem dúvidas, a presença ubíqua da indústria cultural e
dos veículos de comunicação em massa tem contribuído para o aprofundamento
deste processo cujo efeito mais sintomático tem sido a “homogeneização dos
costumes” que inibi as expressões voluntárias das formas singulares expressas
nos modos vivendi locais.
Beatriz Sarlo ao fazer um
rápido balanço do que se perdeu da “cultura popular” em sua longa transição
para a “cultura de massa” realça a perda das “identidades cristalizadas e os
velhos preconceitos” (2000: p.103) que vigoravam nas sociedades de “vocação”
tradicional afirmando que “a cultura da mídia converte a todos em membros de
uma sociedade eletrônica, que se apresenta imaginariamente como uma sociedade
de iguais” (Idem: p.104).
Não é difícil imaginar que
num passado não muito remoto da “civilização rústica” nordestina anterior ao
fenômeno da urbanização e das transformações processadas pela penetração das
formas capitalistas modernas no campo sujeitos como Dalila se constituíam base
relevante da sociedade sertaneja dentre os quais vaqueiros, beatos, andarilhos,
penitentes, roceiros, artesãos, benzedeiras, cantadores e poetas populares,
eram apenas, para citar alguns exemplos, figuras tão triviais que mal
mereceriam serem classificadas como “tipos”.
Moradores de Lago do Bairro - Piauí, vendo uma transmissão de TV pela primeira vez em 1993. |
Com o fenômeno da expansão e
surgimento de novas vilas e cidades nos sertões nordestinos que na região do
Seridó potiguar encontra seu ápice na primeira metade do século XX alentado
especialmente pelos ventos alvissareiros da promissora cotonicultura regional,
a “fazenda de criar” que até o final do período oitocentista “era o espaço de
moradia e de trabalho do homem seridoense, que se dedicava à lida com o gado e
a semeadura da terra” e se constituía “por excelência, o espaço do acontecer
regional” no dizer de Morais (2006: p.80) foi dando passagem para o
florescimento de núcleos urbanos em suas adjacências que chegaram a alcançar as
categorias de vila e cidade onde se desenvolveram associadas a outro conjunto
de “tipos humanos”, isto é, não mais aqueles sujeitos “afeitos ao trato do gado
e da terra” identificados com a “cultura campesina” que o folclore regional tão
prenhe de preconceitos encarnaria na simbologia do “matuto”, mas ao habitante
da cidade, ao homem citadino, afeiçoado ao cidadão instruído, “civilizado”,
“sociável”, polido.
Fazenda de Criar localizada no município de Cruzeta |
Se na primeira metade do
século XX a fisionomia regional era a de um espaço que caminhava para o
progresso e a modernidade, mas que ainda encontrava-se eclipsado pela dinâmica
do mundo rural, os primeiros decênios que se seguem ficarão marcados pelas
relações de predomínio da cidade sobre o campo, do urbano sobre o rural, em que
a cidade passará a assumir o papel de centro aglutinador de sociabilidades. Era
na urbe que o velho camponês e sua família comercializavam sua produção
agrícola em feira livre semanalmente e participavam das celebrações ao santo
padroeiro de devoção de ano a ano. Era também na cidade que os jovens sitiantes
costumavam matar a fadiga da faina num gole de cachaça na “folga” de fim de
semana tecendo com o ambiente urbano seus vínculos de diferença e afinidade[3].
Assumindo desse modo a
função de lócus do poder político-econômico da região e centro criativo de
produção e reprodução da cultura a partir de meados do século XX, a cidade
passa a lograr o “carisma” de centro em relação à “periferia”, o campo, numa
relação de inversão ostentando o lugar medianeiro privilegiado nas negociações
simbólicas e de poder que antes irradiava do espaço campesino. Quando a
“paisagem matuta” das cidades se transformam dando o ar das graças do progresso
num movimento que tendeu absorver o próprio campo e com ele seus “habitantes
rústicos”, são estas “figuras paradigmáticas” que antes povoavam o mundo rural,
mas que mantinham vivos liames com os núcleos urbanos ascendentes, que agora
parecem desvanecer-se com a velha fisionomia da “urbe pitoresca” diluídas na
“paisagem da saudade” pintada pela memória.
Centro urbano de Cruzeta. Meado dos anos 1960. |
É neste sentido que dizemos
que os tipos populares são uma construção a
posteriori, já que projetados pela memória e pelo ato de lembrar e
reconstruir o passado (contar e narrar o vivido) surgem imbricados com a
lembrança da vivência da cidade e das “características típicas” do lugar
conduzindo em sua gênese o tirocínio da saudade. Como crias da memória, eles
refletem a imersão do indivíduo na experiência pessoal e coletiva no espaço
urbano, do saudosismo, na expressão de Othon Filho, dos “tempos jucundos”. De
tal modo suas fisionomias estão inseparáveis da recordação coletiva e urbana
dos grupos comunitários que estes “vultos pictóricos” passam a constituírem-se
em “pontos de referências na memória geral da população”[4]
corroborando a ideia de Halbwachs de que “as memórias são construídas por
grupos sociais, pois são os indivíduos que lembram, no sentido literal, físico,
mas são os grupos sociais que determinam o que é “memorável”, e também como
será lembrado” (Halbwachs apud. Burke. 2000: p.2).
Desse modo, as práticas
culturais e as representações que dimanam são apropriadas pelos sujeitos
sociais como elementos definidores dos espaços à medida que investem sobre
estes significados ao utilizarem os conteúdos de suas crenças para expressar
seus modos de sentir e viver em comunidade inscrevendo neles uma memória e uma
história. Simon Schama é bastante elucidativo neste ponto quando diz que “o
próprio ato de identificar (...) o local pressupõe nossa presença e, conosco,
toda a pesada bagagem cultural que carregamos” (1996: p. 17). Refletindo sobre
isto Michel Pollak (1992) argumenta que a memória é parte do processo de
construção do sentimento de identidade constituindo não somente um elemento
análogo a ela, mas também constituinte desta que se estabelece através da
tentativa de negociação e da reconstrução da imagem de si. Logo, são através
destas estreitas relações que os sujeitos e os grupos sociais estabelecem com o
lugar a partir de suas lembranças apoiadas sobre os “espaços-comuns de
memórias” que se dá a construção de identidades.
Centro urbano de Currais Novos. Na foto aspecto da Praça Cristo Rei no final dos anos 1940. |
Em vista disso, trazer para
o cerne da discussão a construção dos tipos populares é entendê-los tanto como
“lugares de memória” quanto como produtos da memória individual e de grupo que
num determinado momento da história encontrou razões e circunstâncias
favoráveis para sua fabricação. No entanto é necessário fazer a distinção entre
dois tempos de produção que tende a interpenetrar-se na longa duração: o da
experiência do vivido experimentado no tempo próprio dos acontecimentos
caracterizado pela “não consciência” do significado destes sujeitos para “os
caminhos da urbe” como expressou Inácio Cavalcanti ao recordar os “vultos
populares” do Ceará-mirim de sua puerícia e mocidade[5]
e aquele que envolve a experiência do ato mesmo de contar e narrar o passado
vivenciado (a memória), momento em que os tipos populares estão sendo
“inventados” como tais, isto é, extraídos de sua “existência temporal real” e
dotados de uma significação simbólica na história uma vez que “tudo o que é
chamado hoje de memória não é, portanto, memória, mas já história (...). A
necessidade de memória é uma necessidade da história” (Pollak, 1989: p.14).
No município de Cruzeta,
lócus principal de nossa pesquisa, esta produção está relacionada à construção
das identidades culturais locais forjadas, sobretudo pela obra da professora
Teresinha de Medeiros Góes intitulada “Noções de geografia e História do
Município de Cruzeta” notadamente num capítulo dedicado aos “tipos populares
cruzetenses”. Esta obra elaborada para fins didáticos de ensino e pesquisa com
o objetivo de fomentar “o sentimento de patriotismo e de amor à terra natal” e
contribuir com a “formação dos jovens da terra” ainda permanece como principal
fonte de informação da história local granjeando ao longo do tempo o mérito
institucional de “história oficial” do município[6].
Frontispício do livro Noções de Geografia e História do Município de Cruzeta publicado em 1971. |
Não é possível mensurar de
forma empírica o impacto que esta obra publicada pela autora em 1971 com a
pretensiosa missão de “registrar tudo que a terra é, e o que aconteceu aqui em
50 anos” representou para a constituição das identidades locais e para a
formação intelectual de gerações de cruzetenses. Mas é possível deduzir que a
sua publicação tenha servido como uma “válvula de escape” para a introjeição da
“tradição dos tipos” na localidade já que também esta produção era ensinada em
sala de aula juntamente com os conteúdos relacionados às tradições, aos
costumes e ao folclore locais. Mas por que sujeitos como Dalila que até então não possuíam nenhuma notoriedade e se confundiam com a própria massa popular mereceram algum destaque na história cruzetense no momento em que as "identidades locais" estão sendo geradas e pensadas?
É possível presumir que num
determinado momento de nossa história estes indivíduos que até então não possuíam
nenhuma visibilidade pública passaram a ser vistos como “entidades simbólicas”
que expressavam muito as nossas origens, a nossa trajetória por manter com o
passado da tradição, isto é, da memória longa, um vínculo de continuidade e
pertencimento. Imbuídos deste novo significado eles se convertem na prova viva
de uma tradição que se perpetua e se reatualiza no tempo presente, mas que
diluída no novo contexto do momento mereceu destaque por sua característica
“exótica”, “pitoresca” e “singular” frente aos novos valores e comportamentos
do mundo moderno. Eles passam a representar a antítese do homem moderno,
civilizado, instruído, adestrado e citadino que se almeja, mas que ao manter
com a tradição um ethos que a
rememora e a reencena em seus gestos, feições, indumentárias, linguagens e
atitudes, foram transformados em “figuras folclóricas” (tipos-populares) tão
absorvidos pareciam estar naquele passado “mítico” fundante. Tornaram-se, por
assim dizer, na própria “tradição encarnada” que já não se deseja, nem se tem
mais como ideal, mas que por algum motivo se quer ainda por perto.
Anacreonte Pereira, o "profeta do Seridó". Tipo popular cruzetense |
No âmago da sociedade em
processo de modernização e urbanização aceleradas capitaneada pelos princípios
da racionalidade e da técnica, o “tipo-popular” com toda sua bagagem cultural
fermentada na tradição do mundo rural não tem espaço senão como sujeito anômico
e anômalo, avesso ao novo, ao moderno, ao estilo de vida citadino, lugar-comum
do indivíduo polido, “civilizado”, “adestrado”, “sociável”, do “homo operandis”. Habitar a cidade é
compartilhar de outras representações e significados inerentes ao modo de viver
citadino que inclui aí o inteirar-se nos novos círculos e formas de
sociabilidades sincréticas. A cidade em sua organicidade passa então a adquirir
a função de “adestrar” os indivíduos para a vida em sociedade dentro de novos
valores, condutas e padrões de relacionamentos mais complexos.
Em meio a este modelo ideal
de homem e sociedade, o tipo popular é aquele que foge à regra. Ele traz
consigo ainda alguma aura do primitivo espírito comunitário anterior ao
individualismo moderno que começa a se fragmentar, a dissolver-se. Na cidade,
ele se torna um sinal do que ainda existe do inculto, do rude, do grotesco, do
“involuído”, do irascível, do ridículo, mas que confere ao lugar um traço todo
peculiar pela performance e caricaturização de sua presença espontânea,
singular, empolgante. Neste novo espaço ele torna-se a “personalidade de
costumes estranhos” que difere do habitual e do aceitável por agir fora das
normas de vivência e de conduta padronizados da comunidade.
Vendedor ambulante. Tipo popular urbano |
Condenado a ser sempre o mesmo, a nunca mudar ou progredir em seu plano existencial, o “tipo folclórico” foi muitas vezes pintado como um indivíduo destituído de uma história própria. Sua existência raramente fora pensada em termos de processo. Não pudera ser senão raciocinada enquanto “modelo” de repetição ou reprodução da tradição rememorada. Ele era assim, vestígio de uma sociedade tradicional em colapso onde o “alento” do progresso não pudera penetrar.
Não foi a toa que Terezinha de Jesus Medeiros Góes ao escrever sobre “a Vida de um Povo” em capítulo dedicado à história cruzetense situou entre as “tradições” e os “mitos” do lugar os tipos-populares “que os seus habitantes viram ou estão vendo passar por suas ruas e sítios” e que “marcaram ou estão marcando nossas lembranças, pelo FADO que lhes fora imposto, numa longa ou curta vida nesta terra” (p.77) e Othon Filho lamentou em suas memórias de “menino rurícola” o desaparecimento de muitos “tipos” currais-novenses junto das “mais preciosas tradições” locais absorvidos pelo “progresso” da cidade.
Vaqueiros desfilando no cortejo simbólico da Festa da Colheita no município de Cruzeta |
Associado ao universo das
tradições locais, o tipo popular ou “figura folclórica” teria o seu lugar na
“lógica” da história cruzetense. Mas ele não ocuparia o espaço privilegiado
reservado aos “fazedores de história”, isto é, aqueles indivíduos que pela sua
existência excepcional interviram através de seus “feitos” e “atos” na história
rompendo com o passado e a força da tradição fazendo girar a mola do
desenvolvimento e do progresso. Sem estes, o sentido da própria história em
Terezinha Góes seria impensável. Sem suas poderosas atuações, o progresso, a
evolução, o desenvolvimento, em suma, a própria marcha da história e da
civilização não teria sido possível[9].
É por este e outros motivos que os tipos populares cruzetenses não podem ser pensados
sem que se estabeleça um contraponto entre estes e aqueles outros sujeitos
forjados pela história local: os chamados “vultos históricos”.
Dr. Sílvio Bezerra de Melo, exemplo de "vulto histórico" cruzetense |
Um “vulto histórico” é antes
de tudo, um personagem notável, insigne, exemplar, cuja memória e atuação
sem-par na história mereceram notabilidade e registro para a posteridade. Este
fora ordinariamente pintado como “homem esclarecido”, de “decisões
inquebrantáveis”, envergando uma “moral insofismável” sempre dedicado à “causa”
da terra. “Homem de fé”, “batalhador incansável”, “honrado chefe de família”,
“cidadão digno” ou “zeloso pelo bem comum” de “índole pacífica e benfeitora”,
características morais e éticas exaltadas nos vultos ou personalidades
históricas locais, ostentavam em comum o fato de serem quase todos eles
provenientes das famílias e camadas sociais mais abastadas ou dominantes da
sociedade e, por conseguinte detentoras de alguma proeminência política ou
prestígio público.
Vergôntea dos Medeiros do
Seridó na ascendência do Capitão-mor Manuel de Medeiros Rocha, “cidadão honrado
e trabalhador, de resoluções inquebrantáveis, mas sempre tomadas para o bem
comum”, homem praticante da fé católica, “exemplo de honrado chefe de família
digno cidadão, zeloso pelo bem comum”, assim exaltaria Terezinha Góes em páginas
dedicadas aos “Homens e Feitos” de sua “terra natal” o Sr. Joaquim José de
Medeiros notabilizado em sua obra pelo ato de ter doado “generosamente” ao
“Patrimônio de Nossa Senhora dos Remédios, todas as terras onde hoje edifica-se
a cidade”
passando à história como o célebre “fundador” e “patriarca” de Cruzeta (1971,
p.84). Para além da trama local e regional, a história nacional e universal
impregnariam suas páginas com as façanhas destes “notáveis” personagens.
Em contraposição a estes, os
tipos populares foram continuamente identificados aos sujeitos sem história, ao
“participante anônimo”, “de menor representação”, de papel “figurante”, sem
atuação política, desmunido de vontade própria, ou seja, ao cidadão ingênuo,
simples, rude, idiota, mas que sua presença “curiosa” e “impressionante” por
demais popularíssima, tornou-o digno de nota.
José Manuíno, vulgo Zé Borralheira. Conhecido tipo popular cruzetense. |
Ao contrário do vulto ou da
personalidade histórica que pode ser tomada como “representação universal”, o
tipo popular viria geralmente vinculado à elaboração literária local e regional
ancorado num “regionalismo saudosista” mantendo com estes espaços de produção
um elo de aparente particularidade.
Na trama da história local
ambos parecem habitar ora o mesmo espaço físico moldado pela paisagem natural e
urbana ora aparecem vinculados a ambientes geofísicos e humanos distintos (o
campo ou a cidade), porém na dimensão do simbólico foram levados a atuar em
espaços e universos semânticos diferentes. Se o vulto histórico é aquele que
interfere na “tradição” aqui percebida como o campo do repetível, do estável,
do cotidiano, do “eterno devir” estabelecendo o sentido da história, o “tipo
popular” é aquele que revifica a tradição estabelecendo um sentido de
continuidade no tempo. É em vista disto que a “figura folclórica” precisa ser
estudada como elemento inerente da “paisagem simbólica” que define certa
comunidade ou caracteriza os lugares nos diversos contextos e condições de
produção, pois um “tipo folclórico” é sempre “um indivíduo idealizado que
reúne, em si, o conjunto de características folclóricas que definem certa
comunidade”[10].
Pertencendo ao mundo das
“tradições inventadas”, “construídas e formalmente institucionalizadas” assim
como se aplica o conceito em Hobsbawn (1997), o tipo popular ou figura
folclórica é uma invenção ou construção intelectual e social produzido em
determinados contextos socioculturais e ideológicos historicamentes definidos
que nem sempre existiram como tal desde sempre[11].
A Europa do final do século
XVIII e do início do século XIX foi pródiga na forjadura destes garbosos
personagens no momento em que camponeses, pastores e aldeões de regiões as mais
diversas e afastadas passaram a “invadir” as cidades europeias conduzindo seus
trajes, modos, dialetos e costumes que pareciam “estranhos” aos dos habitantes
citadinos despertando neles a “curiosidade” e a “bizarrice” quando estas
começavam a se modernizar e industrializar-se fruto de uma urbanização
acelerada, da revolução tecnológica e científica, da
ebulição das artes e das ideias que o Velho Mundo ensaiava neste período.
Tipos populares franceses com seus trajes típicos |
Para Peter Burke (2010) este
momento foi marcado por um verdadeiro movimento de “descoberta do povo”, o
chamado folk, disseminando-se pela Europa justamente quando se pensava que a
cultura popular estava começando a desaparecer e que o povo com seus jeitos,
costumes e saberes (cerimônias, ritos, crenças, superstições, baladas,
provérbios e etc.) se tornaram “objeto” de curiosidade para muitos estudiosos
que se voltavam para ele não somente pela peculiaridade e exotismo que inspiravam,
mas porque acreditavam terem encontrado nele e em suas criações a “alma
primitiva“ da nação.
Foi neste período que o
“povo” passou a ser objeto de um verdadeiro culto e até os intelectuais mais
polidos (em sua maioria proveniente das classes mais abastadas) buscavam se
identificar com ele e imitá-lo em suas tradições. Esta valorização pelo
“popular” fora muito recorrente na frequente utilização de figuras de porcelana
com formas de camponeses e pastores em seus “trajes típicos” utilizadas como
objetos de decoração nas salas de visitas mais elegantes muito em voga neste
período como comenta Peter Burke.
Não foi por acaso que a
celebração dos tipos populares esteve sempre associada aos movimentos
folclóricos nacionais e regionais tanto na Europa como no Brasil de onde os
intelectuais mais provincianos buscaram extrair a seiva intelectiva para a
fabricação e reconhecimento destas “figuras pitorescas” locais que se dizia
ameaçadas a desaparecer com o desenvolvimento e o progresso das cidades. Porém,
não se pode esquecer que no interior dos movimentos folclóricos brasileiros
calhava uma ambiguidade vigorante disfarçada.
Tipos Populares Portugueses - Lavadeira do lugar de Aradas - Aveiro |
Desenvolver social,
econômica e culturalmente a região, desejo tonitruante das elites políticas
regionais interessadas na modernização ancorada no binômio industrialização/urbanização, significava superar o passado de “atraso”
sedimentado na “tradição”, isto é, “negar” a cultura arcaica do homem sertanejo
mantenedora da estagnação regional ao mesmo tempo em que se devia esforçar-se
para “salvaguardar”, leia-se, registrar (descrever) as tradições folclóricas em
contínua ameaça pelos diversos confins do país “pagando um alto tributo da
tradição ao progresso”. Desse modo, a mesma elite intelectual que aspirava ao
progresso e se incumbia de implementá-lo nas localidades dentro de seus
diferentes meios (educacionais, intelectuais, tecnológicos e sociais, por
exemplo), era a mesma que empreendia esforços para não deixar “cair no
esquecimento” as mais “preciosas tradições do povo”[13].
Sertanejo cruzetense pousando em seu tradicional meio de transporte (jumento). |
Neste sentido, é possível
vislumbrar que na elaboração dos tipos populares estivesse implícita a defesa
de determinados traços socioculturais de permanências que aparecem como fatores
de resistência coletiva e cultural do grupo comunitário frente às novas
mudanças movidas pela passagem do modo de viver do “bairro rural”
característico das pequenas vilas e povoados do interior sertanejo à vida mais
dinâmica no centro urbano[14].
A
Tradição escarnecida
Do ponto de vista das formas
simbólicas estas mudanças vieram acompanhadas de uma nova noção de sujeito. O
“tipo popular” inexistente no mundo rural sobressai-se neste contexto como
arquétipo de indivíduo que não se deseja e nem se tem como ideal, ou seja, ele
encarna aquele sujeito social que ninguém espera ser, que perdeu sua funcionalidade
prática enquanto modelo a ser seguido pela comunidade posto que não corresponde
ao ideal de cidadão moderno e polido que se aspira, mas que ao manter uma
memória vinculada ao “passado da tradição” e expressar uma “experiência social
muito particular”, um “ideal de relações intensas de espírito comunitário”
(Carvalho. 1992: p.32), foi transformado em “signo diacrítico” do folclore
local.
Sinhá Alexandrina. Benzedeira e parteira curiosa afamada. Figura dentre os mais conhecidos tipos populares cruzetenses |
Neste sentido, é importante
pensar o folclore como discurso de elite, como uma categoria erudita criada
para classificar determinadas práticas simbólicas coletivizadas, tradicionais e
persistentes atribuídas a grupos societários bem definidos, pois como bem
expressou Carlos Rodrigues Brandão “qualquer que seja o tipo de mundo social
onde exista, o folclore é sempre uma fala. É uma linguagem que o uso torna
coletiva. O folclore são símbolos. Através dele as pessoas dizem e querem
dizer” (1982: p.107).
Assim sendo, o tipo popular
reflete a visão um tanto quanto deformada e preconceituosa do homem citadino
que se reconhece já com uma dose de “superioridade” frente aquele “outro”
sujeito habitante da cidade ou do campo (“menos civilizado”) que se apresenta
com características “rústicas” ou “exóticas” em face dos novos padrões
apreendidos pela “civilização urbana” (lugar de onde fala e produz sentidos).
Ele é aquele sujeito social que originário do campo foi incorporado
progressivamente à esfera da cultura urbana com a expansão das cidades, mas que
não sofreu o processo de “urbanização civilizatória” a ponto de perder suas
referências tradicionais anteriores[15].
Donzila Correa Cunha, esposa de Seu Antônio Alves Cunha e primeira fotógrafa do município de Cruzeta. Modelo de Mulher moderna e polida para os cruzetenses das gerações de 1950 e 60. |
O tipo folclórico foi,
então, “inventado”, como uma representação do “outro” para responder aos
anseios ideológicos fomentados pelos novos valores e padrões de comportamento e
socialização da sociedade que o integrou e o “criou” e que agora deseja se
reconhecer como o seu “diferente” mantendo com ele uma ambígua relação de
“afinidade” e "diferença". Ele é o “outro” do grupo que ninguém se
“espelha”, mas que traz “em grande dose o que as pessoas carregam consigo de
grotesco, excêntrico e ridículo”, sendo notado, observado e explorado com arte
e humor, tornando-se, porque não dizer, querido no seio do grupo social[16].
Ele é por tudo isso o
antimodelo social a ser seguido, uma representação humana do “indesejável”
criada por aqueles que já não se enxergam como parte de seu "mundo",
pois “o presente tem um interesse vivo pelo passado – quer se compreender como
continuidade e diferença em relação a ele” (Decca apud. Jucá. 2003: p. 39) e os
tipos populares lembravam em seus “traços” e “fados” “as marcas” daquele
“passado de atraso” imorredouro, aquilo que exatamente devia ser superado. E
eram estes “vestígios” arcaicos de estagnação e retrocesso que se escarnecia em
seus atributos físicos e psicológicos expondo-os a caricatura e a risota
pública.
A identificação de um “tipo
popular” passava primeiramente pelo reconhecimento público do traçado
psicológico e físico de uma “personalidade de costumes estranhos”. O grande
número nos quais foram produzidos demonstram suas especificidades físicas e
psicológicas num quadro de características gerais mais homogêneas. Não foi a
toa que quase todos eles foram imaginados risões, valentões, glutões,
alcoólatras, lunáticos, loucos, esquizofrênicos, débeis mentais,
supersticiosos, maníacos, tartamudos, tagarelas, grosseirões, bobalhões,
fanfarrões e malcriados, características comuns ligadas a dois ou mais
personagens.
Crianças cruzetenses brincando de "encarnar" o "tipo do matuto" em noite junina |
O tipo físico que encarnavam
também não era menos indicativo. De cabelos encarapinhados, magricelos ou
fortes, rostos redondos ou alongados, agigantados ou de estatura mediana, olhos
fundos ou esbugalhados, tez macilenta ou “afogueada”, eram quase todos
caboclos, negros ou mulatos, uns franzinos e raquíticos, outros abrutalhados.
Tão pejado de significado e
arremedo eram igualmente suas indumentárias e apetrechos. Maltrapilhos ou
“rústicos”, andavam sempre em desalinho ou “fora de moda”, usavam calças
remendadas ou obsoletas, portavam chapéu de couro ou de palha na cabeça, nem
sempre usavam alpercatas. Alguns exemplos são bastante sugestivos. Memeu de
Urubu, tipo popular currais-novense, “era corpulento, andava de mescla azul
engomada (calça e paletó), gurinhêm (chibata grande). (...) Usava chapéu de
couro novo. Andava num jumento bem arreado e marchador” (Filho. 1970: p.54).
Rafael Doido, conhecido em todo Seridó como o “doido da trouxa”, era um
”peregrino sofredor, carregando indefinidamente sua cruz, onde levava velhos
moafos, roupas sujas, comida, sujeira, pedras etc.” (Idem: p.52). Inácio Boró,
outro tipo popular de Currais Novos, usava “calças remendadas e pouco asseadas
com a perna esquerda arregaçada até o joelho e a direita mais baixa (...).
Carregava sempre um bornal de couro a tiracolo, no qual punha o artifício, o
cachimbo, uma velha faca de ferreiro, o fumo, etc.” (Ibdem: p.53).
O rol das profissões ou das
ocupações que se dedicavam não é menos constatatório e revela o vínculo com o
passado e a tradição. Othon Filho recordando os tipos populares da Currais
Novos de sua puerícia em defesa daqueles que “ninguém se ocupa, mas [que]
encheram suas épocas” é pródigo nas descrições do conjunto e aponta seus
ofícios. Assim era Seu Floriano, homem de “alma generosa e boa” empenhado na
caridosa tarefa de “ajudar os enfermos” e “amortalhar os mortos”. Foi oleiro em
outro tempo e ainda capinava o solo para terceiros em trocas de alguns tostões.
“Caboclo, morenão, estatura regular, bigodinho, chapéu de couro e alpercatas de
correia, camisa por fora das calças. Era a moderação personificada em todos os
sentidos” (1970: p.163-64).
João Bôlo, “caboclo, magreirão,
de boa estatura. Usava, forçado pelas circunstâncias, uma barbicha e bigode mau
tratados, como sua pessoa. Não se
apartava de um pau torto que possuía, á guisa de bengala (...)”. De “machado ao
ombro, andar arrastado, chapéu de palha coberto de pano, pouco asseado da
cabeça aos pés”, trabalhava como lenhador, não possuindo mais que “um casebre
ordinário e um machado com que cortava lenha na cidade para várias pessoas
(Idem: p.125-126) e Sebastião Pé de Pato, “mulato de rosto comprido, narigão
chato, boca grande, barba e bigode raspado” (Ibdem: p.106), além de roceiro e
agricultor, era poeta, embolador e repentista.
Terezinha Goes reportando-se
aos tipos populares cruzetenses de seu tempo elenca alguns em sua obra e traça
o perfil de como seriam e/ou deveriam ser lembrados pela posteridade. Tongo, um
“débil mental” de “idade já avançada”, figura por demais conhecida em todo
Seridó, “caracterizava-se por um rodar de cabeça semelhante ao do caboré[17].
Enquanto rodava a cabeça, revirava os olhos. Lançava terríveis palavrões contra
a molequeira da rua que o insultava” (1971: p.77-78). Manuel Telo,
“esquizofrênico” e “improvisador de versos”, “não raro tornava-se furioso,
valentão”, sendo temido pela gurizada da rua (Idem: p.78) e Zé Borralheira,
“maluco” e “comedor”, “andava sempre muito sujo, carregando trouxas sujas e
pesadas”, tornando-se agressivo quando a meninada chamava-o de “tapuru[18]
(Ibdem: p.79).
Poderíamos, pois, oferecer
uma lista mais ampliada e detalhada destes tipos. No entanto, a abundância nos
quais foram criados forçar-nos-ia a uma descrição mais densa e exaustiva
dispensável num estudo apenas inaugural. Se as descrições físicas e
psicológicas nos oferecem uma visão mais pictórica e idealística destes
personagens e que por isso, menos holística e realista dos sujeitos,
analisarmos as contingências históricas em que viveram nos aproxima antes do
“sujeito histórico” ocultado no tipo. É com este intuito que passamos a
analisar o caso específico da beata Dalila Maria da Conceição, dona de casa
solteira, moradora do município de Cruzeta transformada em tipo popular pela
memória coletiva cruzetense.
O caso da beata Dalila
Muitas vezes as condições de extrema pobreza e miséria nas quais viviam muitos indivíduos serviram de fundamento para a construção de diferentes tipos populares. |
O caso da beata Dalila
Trabalhando
com a perspectiva micro-histórica estamos considerando um caso particular em
que buscamos relaciona-lo com a dinâmica social e cultural de uma determinada
sociedade, em um determinado tempo. A observação privilegia a redução de escala
com o intuito de possibilitar um dialogo com o todo e revelar características
que na maioria das vezes são desprezadas em relação aos aspectos gerais.
Conforme Abelardo Montenegro
(1973) citado por Cristina Pompa (2004, p.79)
Beato
é um sujeito celibatário, que fez votos de castidade (real ou aparentemente),
que não tem profissão porque deixou de trabalhar e que vive da caridade (Xavier
de Oliveira). [...] passa o dia a rezar nas igrejas, a visitar os enfermos, a
enterrar os mortos, a ensinar orações aos crédulos, tudo de acordo com os
preceitos do catecismo (M. Diniz). [...] Há beatos que pedem esmola, que são
sustentados por outrem e que vivem por conta própria, do trabalho nos sítios
(F. Bartolomeu). [...] Veste à maneira de um frade: uma batina de algodão tinta
de preto, uma cruz às costas, um cordão do São Francisco amarrado na cintura,
uma dezena de rosários, uma centena de bentinhos (R. de Souza Carvalho).
Os
beatos são pessoas solitárias que costumam viver errantes, entregam-se
totalmente a vida sagrada, muito sabem das escrituras, chegando até a suprir a
carência de padres em várias localidades do sertão.
Antônio Conselheiro. Modelo de beato sertanejo |
No que diz respeito à Dalila, será possível
“conhecê-la” de forma muito superficial, pois não é possível reconstruir o
sujeito em sua totalidade, o que ela pensava e sentia, nunca iremos saber de
fato, uma vez que as narrativas construídas em torno dela (depoimentos e falas)
nos fornecem apenas o olhar do outro sobre ela e nunca o olhar da personagem
sobre si mesma.
As
informações acerca de sua biografia são ainda bastante incipientes tendo em
vista o caráter inaugural da pesquisa e o reduzido número de depoimentos
coletados. Em busca de pistas biográficas, sabe-se que Dalila Maria da
conceição nasceu em 24 de agosto de 1913, em Acari, um pequeno município
localizado no estado do Rio Grande do Norte, sendo filha de Joaquim Paulino e
Joana Maria da Conceição.
Analfabeta por não ter frequentado a escola, ainda na
pré-adolescência fora designada por sua mãe a trabalhar em casas de famílias
abastadas da região como ama (babá) de crianças e em sua juventude, bem como na
fase adulta, permaneceu trabalhando neste ofício e ainda como cozinheira e
acompanhante de parturiente (mulher que está para dar à luz).
Além do trabalho em casas de família abastadas, Dalila se
entregou a “vida profana” (expressão que segundo depoente costumava utilizar
para referir-se a vida de prostituição durante sua mocidade) da qual garantia o
sustento de seus filhos. Em se tratando de seu aspecto físico, era
mulata de olhos claros, de média estatura, de beleza singular e sedutora.
Vestia-se à moda da época.
Dalila em sua mocidade pousando para fotografia no final dos anos 1930. |
Em fins da década de 1950, posterior a muitos problemas
de saúde e de ordem espiritual, Dalila consagrou-se ao catolicismo, passou a
vestir-se de forma contrária ao que já foi
descrito. Aderira ao estilo de beata do sertão. Ora vestia branco, ora estava
trajada como São Francisco de Assis (santo de devoção pessoal). Trocou as
joias por terços, rosários e fitas das irmandades religiosas. Ao invés de
sapatos com salto alto, ela preferiu as chinelas entre dedos. Os chapéus a belle epoque deram
lugar aos lenços ou rodilhas na cabeça. Com novo entusiasmo Dalila aderiu à simplicidade e de forma
tranquila, passou a viver unicamente como zeladora do cemitério público de
Cruzeta e do Cruzeiro das Almas inaugurado pelos padres Redentoristas em 1957,
função que desempenhara com muita dedicação até a morte.
Tornando-se uma pessoa extremamente religiosa,
católica praticante, devota de muitos santos; rezava terços e rosários e
mantinha proximidade com as freiras e os padres, em especial Padre Ambrósio e
Padre José Alves, ambos os párocos de Cruzeta, para os quais, prestou seus serviços
de cozinheira. Levando uma vida abnegada aprendeu o oficio de benzedeira e por
ser muito supersticiosa, não benzia qualquer pessoa e quando o fazia, não exigia
nada em troca.
Em meados da década de 1960, Dalila fora acometida por
uma doença que muitos denominam como esquizofrenia, motivo pelo qual fora internada numa casa de saúde para doentes mentais em Natal/RN, sendo algum
tempo depois resgatada por Silvio Bezerra de Melo (Engenheiro agrônomo e primeiro prefeito
constitucional de Cruzeta) por considerá-la curada. Nos anos
posteriores, ela teve várias crises de depressão, fato este que facilitou sua
aposentadoria por esquizofrenia.
Como São Francisco de Assis, Dalila trocou suas vestes de luxo e abraçou o hábito da pobreza |
É aceitável que a suposta "esquizofrenia" de
Dalila (o diálogo, que nos relatos orais, ela mantinha com os mortos ou com os
seres do além) tenha contribuído para o seu “enquadramento” no tipo popular de “louca” e “esquizofrênica”. Porém têm-se ainda que observar que este atributo está
muito mais relacionado a uma imersão no universo místico do sagrado, aquilo que
Gilberto Freyre já chamava de religião "afetivizada" para
caracterizar as práticas simbólicas da “religiosidade popular” no Brasil
Colônia, do que mesmo à doença psíquico-patológica que chamamos de loucura.
Conversar com os mortos ou trazer mensagens do além faziam parte do universo
místico do “catolicismo rústico” sertanejo desde os tempos coloniais, o que faz
de Dalila um sujeito histórico altamente complexo.
Dalila já na velhice com seu famoso traje franciscano pousando ao lado da imagem de Nossa Senhora dos Remédios, padroeira do município de Cruzeta. |
Entender as circunstâncias históricas e as motivações
pessoais que levaram Dalila a abandonar “a vida profana” e tomar um rumo
radical em sua vida adotando como referência o exemplo de vida abnegada de
tantos beatos e penitentes dos sertões antigos em pleno mundo moderno (há
indícios de que tenha iniciado suas atividades beatíficas entre os anos 40 e
50) é algo ainda que permanece na obscuridade. Mas indícios existem que nos
permitem conjunturar a respeito. O primeiro dele mais plausível está
fundamentado numa possível “conversão moral” que teria vivido a personagem já
no final de sua mocidade levando-a a trocar as “vestes da vida profana” pelo
hábito da pobreza franciscana talvez motivada pela sanha de algum remorso pessoal
ou ainda como sugere a análise de muitos depoimentos, o medo da condenação
eterna no Juízo Final numa conjuntura de iminência apocalíptica.
Com a vida marcada pela heterogenia, a sociedade
desenvolveu vários olhares em relação à Dalila. Há quem a veja como louca,
alguns a veem como uma beata, outros como curandeira milagrosa e há aqueles que
acreditam que ela previa o futuro (vidente).
Já em sua velhice, Dalila sofria com doenças cardiorrespiratórias sem o atestado de diagnósticos oficiais. Essas doenças foram se acumulando, até que em 14
de outubro de 1999, vitimada por insuficiência respiratória, ela partiu com sua
fé inabalável e no dia 15 foi sepultada, tendo aí o fim de sua tão sofrida e
fascinante história[18].
Recuperar os sujeitos individuais, não significa apenas
privilegiar os grandes personagens da história, mas tirar do esquecimento da
memória social, indivíduos comuns, despercebidos. O historiador italiano, Carlo
Ginzburg,
em sua obra “O queijo e os vermes” (1976) onde discutiu sobre circularidade
cultural da Europa (Séc. XVI/XVII), tomou como base a trajetória do moleiro
Menocchio que fora perseguido pela inquisição.
Assim como Ginzburg, tomamos por base a trajetória de
Dalila, pretendemos aqui, também observar como se firma as questões culturais,
uma vez que Dalila é um sujeito histórico que foi inserido dentro de uma
tradição inventada, sendo visto como um tipo popular pela cultura erudita que
assim a classificou.
No primeiro livro escrito sobre a cidade de Cruzeta
“Noções de geografia e história do município de Cruzeta” de autoria da
professora Terezinha de Medeiros Góes, há um espaço reservado para os tipos
populares cruzetenses. O curioso é que dentre esses tipos destacados pela
autora, Dalila não aparece, mesmo que já neste período sua figura de mulher
votada à vida religiosa fosse por demais conhecida na cidade. O motivo pelo
qual não fora registrada como um tipo popular, já nessa época, ainda estamos
para conhecer.
De acordo com os indícios observados na obra
de Terezinha Góes e na obra “Meio século da roça à cidade (Cinquentenário de Currais
Novos)” de Antônio Othon Filho (1970), podemos perceber que os tipos, por eles
apresentados, obedecem a uma mesma lógica, um mesmo estilo, geralmente pessoas
marginalizadas, sem instrução, massacradas pelas precariedades da vida (analfabetismo,
fome, seca, doenças, pobreza extrema e etc.).
Outro
fato observado é que existe uma distância temporal muito significativa (39
anos) entre a publicação da obra de Teresinha Goes (1970) e a publicação da
obra de Walclei de A. Azevedo, denominada de “Fatos Pitorescos de Cruzeta”
(2009) em que Dalila já aparece como tipo popular. O que teria levado o autor de Fatos pitorescos de Cruzeta a classificar
Dalila como um tipo popular? Podemos dizer que Walclei herdou as convicções teóricas
de Terezinha Goes (1970) quando percebemos que o autor teve particularmente a
oportunidade de visualizar sujeitos de “costumes e comportamentos estranhos” de
sua época atribuindo-lhe significado através da experiência do vivido e do
exercício da memória prosseguindo, assim, com a tradição no local. Neste caso o
autor complementa a obra de Teresinha Goes ao inserir no espaço da tradição os
tipos populares mais próximos do nosso tempo, de sua época, os quais não foram
apresentados por ela. É aí que Dalila aparece como figura popular que Walclei
teve a oportunidade de conhecer e observar. Ao tecer sua narrativa sobre ela,
ele o faz em consideração a acontecimentos e histórias que viu e ouviu falar a respeito dela em sua infância e mocidade entre as décadas de 1970 e 80 numa analogia com os tipos populares já
conhecidos por ele nesta época (os tipos populares descritos por Terezinha Góes em seu livro, por exemplo) exatamente no momento em que a "tradição dos tipos" começara a ganhar proporção e sentido na comunidade local.
Com isso é possível dizer que Dalila passa a
ser vista pela sociedade local como um tipo popular a partir da publicação de “Noções
de Geografia e História do município de Cruzeta” entre os anos 1970 e 80 aparecendo apenas em registro letrado na obra de Walclei em anos mais recentes (precisamente em 2009, data da publicação de Fatos Pitorescos de Cruzeta de sua autoria) mesmo que não figure dentre a plêiade de personagens suscitados por
Terezinha Goes em sua obra. Desse modo, a ideia de Dalila como tipo popular
impregnada na memória de Walclei e até mesmo dos depoentes que tem colaborado
com a pesquisa reforça ainda mais a veracidade desta afirmação, já que por um
mecanismo dedutivo de enquadramento sua figura passa a estar associada àquela
obra ocupando um espaço “simbólico” reservado aos tipos populares apresentados
pela autora em seu livro cada vez que a memória desta personagem vem à tona.
Para
concluirmos podemos dizer que tanto Dalila como sujeito histórico, aqui
apresentado, quanto a Dalila tipo popular, fora construída pelo o olhar do
outro e esse outro é o da cultura letrada, da cultura erudita e elitista. Ainda
é cedo para dizer se é possível ou não, seguir a lógica que Ginzburg empregou
no caso de Menocchio (o moleiro de Fiuri/Itália condenado pelo Tribunal do
Santo Ofício no século XVI), um dilema entre culturas opostas, pois no caso de
Menocchio as fontes expõem a sua fala e o seu pensamento. No caso de Dalila é a
cultura letrada que a apresenta como sujeito histórico e como tipo popular. As
fontes não trazem a tona os seus pensamentos e fala. Trazem apenas o seu silêncio
e o que os outros pensam ou sabem a seu respeito.
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Notas
[18] Por se tratar de estudo ainda em fase
preliminar, as narrativas sobre Dalila foram construídas a partir de
depoimentos de três informantes: Alexandrina de Oliveira Campos (75anos),
Céssio Pereira da Silva (45 anos) e Giselda Maria Rocha (82anos).
|
[17] Ave de rapina que se encontra em
certas partes do Brasil, que vem da família das corujas. Também é uma expressão
utilizada para designar pessoa de aparência feia ou ridícula. Fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/caboré/
[18] Tipo de verme, larva, que se cria em
alimentos podres em corpos em decomposição ou em putrefação. Fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/tapuru/
[16] CARRADORE, Hugo Pedro. Retratos das tradições
piracicabanas: tipos populares. Edição Tais Romanelli. Seminário A Província,
1989. Acessado em 05-12-2012. Disponível em http://www.aprovincia.com.br/conversa-de-pescador/retratos-das-tradicoes-piracicabanas-tipos-populares/
[15] O sentido do termo “urbanização
civilizatória” refere-se ao processo discutido por Candido (1971) em estudo já
clássico que defende a ideia de que sobre o ponto de vista da cidade, a
expansão urbanizadora tinha um papel de civilizar os indivíduos “propondo” ou
“impondo” ao homem rústico “certos traços de cultura material e não-material”
(p.218) que antes não fazia parte de seu sistema cultural de crenças, saberes e
valores, condicionando-o a uma reação adaptativa.
[14] A expressão “bairro rural” foi
utilizada aqui na concepção de Candido (1971) como uma unidade social
intermediária entre o grupo familiar e outras formas de sociabilidades mais
complexas caracterizadas por um grupo de vizinhança que se reúne para a
realização de trabalhos de ajuda mútua e participam dos mesmos festejos
religiosos locais, mas não abrangendo, essencialmente, uma divisão
administrativa.
[13] A recorrência ao gênero de memórias e
a literatura, especialmente o conto e o romance, foi um forte instrumento de
“registro” utilizado pelos intelectuais mais provincianos com a finalidade de
“salvar do esquecimento” as tradições folclóricas locais.
[11] Dentro das três categorias de
tradições superpostas classificadas por Hobsbawn, o tipo popular se insere
naquela cujo propósito principal é a socialização, a inculcação de ideias,
sistemas de valores e padrões de comportamento. In. HOBSBAWM, Eric; RANGER,
Terence. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1997.
[10] Citado em “Tipos folclóricos”.
Acessado em 05-12-2012. Disponível em http://www.edukbr.com.br/mochila/tipos_folcloricos.asp
[9] A concepção de história em Terezinha
Góes é tradicional tendo em vista que “oferece uma visão de cima, no sentido
de que tem sempre se concentrado nos grandes feitos dos grandes homens (...).
Ao resto da humanidade foi destinado um papel secundário no drama da
humanidade” (Burke. 1992: p.12).
[7] O sentido da história em Terezinha
Góes é aquele ainda herdeiro do pensamento iluminista oitocentista que
tencionava o esclarecimento da humanidade através do instrumental da razão
chegando a influenciar outras correntes filosóficas e científicas do século XIX
como o evolucionismo de Darwin e o positivismo de Auguste Comte. Em vista
disso, sua obra está perpassada por uma ideia derivada da “Ilustração” ainda
muito em voga no meio intelectual brasileiro no período em que está produzindo
as “Noções de Geografia e História no município de Cruzeta” entre os anos 1960
e início dos anos 70 que se apoia no otimismo técnico e científico motivado
pelas últimas conquistas do conhecimento humano influenciando sua concepção de
“tempo sagital”, isto é, aquele que apontava que o destino humano caminhava
para uma realização sociocultural e intelectual ainda mais plena no futuro,
guiando-se pelo caminho irretroativo do progresso. Daí porque a concepção de
“sertanejo” fora por muito tempo interpretada como um “tipo social” que devia
ser “superado” para que se “cumprisse os
trâmites da lei do progresso” (Macêdo, 2005: p.157).
[8] A noção de “tradição” neste contexto,
especialmente entre muitos folcloristas brasileiros, ainda estava bastante
marcada por uma ideia de purismo aliada à concepção de primitivismo e
imutabilidade da cultura que negava as transformações substanciais sofridas
pelo “fato folclórico” ao longo da história. Talvez seja por isso que diante
das mutações suscitadas pelo mundo moderno, muitas vozes defensoras preferiram
falar de seu desaparecimento em vez de demonstrar as suas modificações.
[5] A nota refere-se ao livro de memórias
“Vultos, fatos e saudades” lançado pelo referido autor em 1985 em que dedica
capítulo aos tipos populares do município do Ceará-mirim/RN que passaram e
fizeram parte “da vida e do progresso da cidade” entre as décadas de 1920 e
80.
[6] Neste sentido a “história ou memória
oficial” seria aquela que se impõe como única e verdadeira e que não abre
possibilidades para incluir outras versões existentes (a dos anônimos, a dos
excluídos, por exemplo), sendo, portanto, aquela história ensinada e
(re)produzida no âmbito das instituições públicas locais.
[4] Citado em “Tipos populares de
Mossoró”. Acessado em 05-12-2012.
Disponível em http://omossoroense.uol.com.br/universo/geraldo-maia/15261-tipos-populares-de-mossoro
[3] Para Edward Shils (1992) a cultura de
uma sociedade está sempre em constante mutação e conflito e que ela nunca é
partilhada de maneira uniforme por todos os seus membros ainda que seja
formulada continuamente de modo a incutir no pensamento das pessoas a ideia de
conformidade, o que significa pensar que a assimilação cultural das identidades
não ocorre de forma exclusivamente integrada, mas sofre processos diferenciados
ao longo do tempo a partir das percepções de afinidade e diferença que os
indivíduos estabelecem em torno dela criando um sistema de representação social
mais ou menos compartilhado genericamente.
[2] Citado por Erhardt e Fernandes
in. Uma
cidade de personagens. Acessado em 05-12-2012. Disponível em http://www3.atarde.com.br/especiais/aniversario_salvador/uma_cidade_de_personagens.htm
[1] O geógrafo francês Vidal de La Blache
é considerado o fundador da escola regional francesa onde sob sua influência “o
objetivo do trabalho geográfico passa a ser o estudo da região, considerada
como uma área onde se realizam as combinações particulares de fenômenos físicos
e humanos e que se caracteriza por uma paisagem única”. Influenciado pela
corrente filosófica historicista, também esteve na origem do Possibilismo, corrente geográfica que se
opunha ao Determinismo e considerava
o homem um ser ativo e não passivo diante das inúmeras possibilidades
oferecidas pelo meio de selecionar, livre e conscientemente, de acordo com suas
necessidades para dominá-lo.
Vidal de La Blache. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora,
2003-2012. [Consult. 2012-12-05].
Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$vidal-de-la-blache>.